Empresas como a Delta Construções,
acusadas de pagar suborno para obter vantagens passariam a responder na
justiça por seus atos, caso Câmara aprove projeto relatado pelo deputado
Carlos Zarattini
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Carlos Zarattini, relator do projeto, quer punir empresas |
Empresas
envolvidas em denúncias de corrupção ou que estejam sendo investigadas
por cometer crimes contra a administração pública terão mais motivos
para se preocupar, caso a Câmara dos Deputados aprove a chamada Lei
Anticorrupção. O projeto de lei 6.826, de 2010, estabelece a
responsabilização administrativa e civil de empresas e seus diretores
pela prática de atos ilícitos contra a administração pública nacional ou
estrangeira. O projeto de lei, editado pelo Poder Executivo, tramita em
caráter conclusivo e a previsão é que seja votado na comissão especial
em que se encontra na Câmara, no próximo dia 23 de maio. Caso seja
aprovado, e não haja requerimento para votação em plenário, seguirá para
o Senado.
Na prática, o projeto institui a responsabilidade objetiva das
empresas. Atualmente, em casos de corrupção, é preciso que se comprove
que a organização enviou alguém para corromper a administração pública.
Em muitos casos, quando flagradas, as empresas argumentam que o enviado
agia por conta própria, sem autorização, e se livra, assim, de
responsabilidade.
Segundo o relator do projeto na Câmara, deputado Carlos Zarattini
(PT-SP), a possibilidade de empurrar a responsabilidade para o
funcionário que participou da negociação deixar de existir. O texto da
lei estabelece que agora a responsabilização será de quem foi o
beneficiário dos atos de corrupção. Ou seja, as empresas.
“As empresas
sempre acusam seus funcionários e dizem que aquilo que foi praticado é
de responsabilidade do funcionário, ou os diretores e presidentes dizem
que não sabiam. Mas agora se observará quem recebeu o benefício, ou
seja, a empresa corruptora poderá ser punida e não apenas seus
diretores, presidentes, acionistas ou qualquer pessoa física que possa
responder pelos crimes”, explicou o deputando em entrevista ao Congresso em Foco.
Se, por exemplo, o texto já estivesse em vigor, a Delta Construções
S.A., acusada de envolvimento com os negócios ilegais do contraventor
Carlinhos Cachoeira, poderia ser punida, e não apenas os seus diretores.
Num caso em que ficasse comprovado que, mediante o pagamento de
propina, a empresa conquistou algum contrato de obra pública, poderia se
dar a responsabilização. Na quarta-feira passada (25), Cláudio Abreu,
ex-diretor da Delta, foi detido em Goiânia e está preso no presídio da
Papuda, em Brasília. Ele foi afastado do cargo após a revelação de ter
ligações com o bicheiro Carlinhos Cachoeira durante a Operação
Saint-Michel, segundo o Ministério Público do Distrito Federal e
Territórios. Abreu é suspeito de corrupção e formação de quadrilha.
Multas e suspensão
De acordo com a legislação vigente, a única pena prevista para
empresas corruptoras é a aplicação da declaração de inidoneidade, que
impede que instituições nesta situação participem de novos contratos ou
licitações. Se aprovada, a nova lei estabelece formas de punição, com
multas de até 20% do faturamento bruto da empresa, declaração de
inidoneidade por até cinco anos e a suspensão do funcionamento da
empresa e algumas outras penas aplicáveis pelo próprio Poder Executivo.
Para Zarattini, o país tem experimentado um período de transformação
nas formas de fazer política e também de fazer negócios “que tem uma
relação direta com o combate à corrupção”. “Existe uma clara decisão da
sociedade – manifesta, por exemplo, em processos de “impeachment”, em
cassação de mandatos e em legislações como a Lei da Ficha Limpa –, de
romper com o círculo vicioso da corrupção e adotar um estilo de governo e
de negócios orientado pela transparência”, afirma o deputado em seu
relatório.
Zarattini também afirma que a punição deve ocorrer dentro de
parâmetros legais e no menor prazo possível. O deputado explica que
“somente assim ficará claro para toda a sociedade que as regras do jogo
mudaram, de uma vez por todas, e que os responsáveis por atos lesivos à
administração pública, pessoas jurídicas ou pessoas físicas, serão
processados e punidos, conforme a lei, de forma rápida e eficaz”.
Acordos internacionais
A aprovação da lei anticorrupção faz parte de uma série de ações que o
governo brasileiro está obrigado a adotar para atender a acordos
internacionais antisuborno e anticorrupção ratificados pelo país. O
Brasil acompanha a Irlanda e a Argentina no grupo de países com
legislação considerada deficitária sobre o tema. Apesar de já ter a Lei
de Licitações (8.666/1993) e a Lei Antitruste (8.884/1994), o país
precisa ter aprovada a sua Lei contra Atos da Administração Pública para
ingressar no grupo de países com leis rigorosas contra a corrupção.
A lei protege ainda os princípios constitucionais de liberdade de
iniciativa, da livre concorrência, da função social da propriedade, da
defesa dos consumidores e dos contribuintes a partir de regras de
prevenção e de repressão à concorrência desleal, à infração ou abuso de
poder econômico que atentem contra as estruturas de mercado.
Em setembro do ano passado, uma comissão especial foi criada para
votar o tema, mas somente na última semana foi apresentado o relatório
final. Na ocasião, o deputado Alberto Filho (PMDB-MA) pediu vista e a
votação foi adiada para o fim do mês.
Embora a intenção seja aprovar rapidamente o projeto, há ainda um
risco de retardamento. Caso 10% dos deputados assinem um requerimento
nesse sentido, o projeto terá que passar pelo plenário da Câmara antes
de seguir para o Senado. “Temos voto para aprovar o projeto na comissão e
enviar diretamente ao Senado, mas estamos conversando com vários
deputados para evitar que o texto siga antes para o Plenário da Câmara,
pois sabemos que sua votação lá pode demorar meses, havendo até o risco
de ser retirado de pauta. É uma matéria importante e precisa ser
aprovada, mas infelizmente, sabemos que o lobby das empresas contra o
projeto é muito grande”, afirmou Zarattini.