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14 de out. de 2013

Editor que usou bolsa de tradução do Brasil pensa em destruir edição do livro ‘Saraminda’ 

SILVIO ESSINGER ( OGLOBO)

RIO – A editora Königshausen & Neumann resolveu não distribuir “Saraminda”, do ex-presidente José Sarney, depois que o consulado do Brasil em Frankfurt deixou de cumprir sua parte do contrato, de comprar 500 exemplares da obra. Beneficiado pelo programa de traduções da Biblioteca Nacional, que, segundo seu coordenador, Fabio Lima, investe em média US$ 8 mil em cada tradução, “Saraminda” tinha lançamento previsto na Feira do Livro de Frankfurt, encerrada ontem.

— Assumo o prejuízo de ter uma publicação para ninguém ler, mas prefiro desistir porque me senti iludido pelo consulado — disse ao GLOBO o editor Thomas Neumann, que admitiu a possibilidade de destruir os volumes já impressos.

Até ontem, Fabio Lima não havia tomado conhecimento da suspensão do projeto. A BN disse que espera a confirmação da decisão para tentar receber de volta a verba já transferida. O tradutor Markus Sahr recebeu os seus honorários diretamente do editor alemão.

Coproprietário da editora especializada em livros científicos, principalmente de filosofia, Neumann explicou que só incluiu no seu catálogo um livro de ficção, ainda mais de um autor “conhecido como político, mas não como escritor, pelo menos na Europa”, por insistência do consulado, na época (e até março deste ano) chefiado por Cezar Amaral. O financiamento da BN só é possível quando uma editora estrangeira solicita a bolsa de tradução e se compromete a publicar a obra. O consulado, através da então chefe do setor cultural, Rita Rios Bonfim, convenceu Thomas Neumann a editar “Saraminda”.

— Aceitei porque o consulado garantiu comprar um número determinado de exemplares e, confesso, porque não sabia direito quem era Sarney. Hoje sei que o meu erro foi grande. Depois de ler muito sobre ele na internet, sobre seu papel em governos passados, fiquei com a impressão de que é uma espécie de Berlusconi do Brasil — disse o editor.

Presentes oficiais

Desde junho no posto, o cônsul Marcelo Jardim reagiu com surpresa à informação de promessa de compra, dizendo que “a história é contraditória”.

— O consulado não tem biblioteca, e por que compraria livros?

Além de ficar irritado pelo não cumprimento do contrato, Neumann passou a temer colar à sua editora uma imagem negativa ao publicar um livro cuja tradução fora promovida por critérios de amizade e de “influência de poderosos”.

De Rita, sua interlocutora no processo, ele recebeu a informação de que os livros seriam usados como presentes oficiais do consulado. Na negociação do livro de Sarney, Rita conseguiu “vender” também o seu próprio livro “Poemas e pedras — a relação entre poesia e arquitetura partindo de Rodin e Rilke”. O ensaio recebeu a bolsa da BN e está na agenda da Königshausen & Neumann para lançamento em 2014.

“Saraminda” foi lançado no Brasil no ano 2000 e já foi traduzido para o romeno, espanhol, francês e húngaro.

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