*Maria Célia Pires Costa
O Ranking Universitário Folha 2013 surpreendeu
(ou não) a todos que integram a comunidade da Universidade Estadual do Maranhão
– UEMA, avaliada como a 7ª Pior Universidade Pública do Brasil. A notícia
repercutiu nos jornais locais, blogs, rádios e na Assembleia Legislativa do
Estado.
O mais doloroso é que, mais uma vez, o
impacto imediato atinge frontalmente os alunos, atiçando o fantasma da evasão
na nossa universidade, pois eles começam a se questionar: “Vale a pena
continuar na UEMA?”.
Essa é a pergunta do momento! O jovem
que pretendia fazer vestibular para a universidade também é assaltado por
muitas dúvidas. Alguns professores pesquisadores da instituição também se questionam,
principalmente os mais jovens.
Na qualidade de professora de química
da UEMA, há 14 anos, sinto-me na obrigação de contribuir com algumas reflexões
para o debate.
Para isso, começo com um breve
histórico recente da nossa instituição e, mais adiante, neste texto, tentarei
alinhar algumas possíveis causas de a UEMA ser a 7ª pior universidade pública do
Brasil.
A década de 90 foi marcada por um
movimento ferrenho de servidores, alunos e alguns professores para garantir
recursos na Constituição do Estado do Maranhão, com uma greve de mais de trinta
dias, debaixo de sol e chuva. O movimento foi vitorioso. Hoje o ensino superior
público do Maranhão possui recursos de no mínimo 5% (cinco por cento) da
receita de impostos estaduais, incluindo a receita proveniente de
transferências, nos termos dos arts. 220 e 272, parágrafo único, da
Constituição do Estado. Portanto, os recursos para a UEMA estão legalmente
garantidos. Outra greve fortíssima marcou o ano de 2003, em defesa das
categorias: professores, servidores técnicos administrativos e alunos. Naquela
época, o salário de um professor da UEMA era inferior ao de professor de nível
médio do Estado. Depois de um período de embate dificílimo, tivemos um grande
ganho: a equiparação dos salários dos professores da UEMA, com os salários dos
professores universitários federais. A situação mudou relativamente, pois até
antes desta conquista, quando havia concurso para professor adjunto, que exigia
título de doutor, ou não apareciam candidatos ou estes eram pouquíssimos. Hoje, são muitos os candidatos. Infelizmente,
nem sempre as lutas foram vitoriosas. Os bravos servidores técnicos administrativos
têm sido as grandes vítimas da universidade. Todas as lutas para equiparar os
salários deles com os das universidades federais fracassaram. Logo eles, que
tanto se empenham para que a UEMA não morra. Mas isso é um reflexo da
desigualdade social do nosso Estado. Na UEMA não é diferente. Enquanto os
professores têm um salário compatível com outras universidades, os servidores técnicos
administrativos se aposentam, em sua grande maioria, com aproximadamente um
salário mínimo.
Então, qual é o problema da UEMA? Por que
ela seria a 7ª pior universidade do Brasil? Tentarei alinhar algumas possíveis causas,
considerando os indicadores da Folha: Pesquisa (total de publicações, total de
citações, citações por artigo, publicações por docente, publicações em revistas
nacionais e captação de recursos); Mercado; Inovação; Ensino (avaliadores MEC,
professores com doutorado, professores com dedicação exclusiva e nota no ENADE)
e Internacionalização (citações internacionais por docente, publicações em
coautoria internacional e docentes estrangeiros):
1) Falta de autonomia financeira:
Embora prevista na Constituição Estadual, a UEMA não tem autonomia financeira,
como têm a USP, a UNICAMP e a UNESP, grandes universidades estaduais do país. Uma das consequências é a desenfreada expansão
dos campi da Universidade, sem qualquer avaliação, e, talvez, sem atender às
reais necessidades do Estado;
2) Falta de transparência: A prestação de contas da aplicação dos
recursos da Universidade é inacessível à população e à comunidade
universitária, que, sequer tem conhecimento de qual o percentual dos recursos
assegurados constitucionalmente é repassado efetivamente para a UEMA. Não há exposição
da gestão financeira dos recursos nos meios de comunicação digital e dos jornais
de grande circulação, nem mesmo nos meios de comunicação da própria
universidade;
3) Infraestrutura deficitária: O
número de laboratórios de ensino e de pesquisa ainda é muito deficitário, bem como
o número de computadores disponíveis para os cursos de graduação. A biblioteca
da UEMA, apesar de toda a dedicação de suas bibliotecárias, não possui um
número suficiente de técnicos para suprir as necessidades do órgão. Isso, além
do acervo defasado, principalmente de periódicos;
4) Administração altamente
centralizada e terceirizada: Os investimentos na universidade são feitos sem
critérios técnicos, de mérito, sem o levantamento das reais necessidades da instituição.
A avaliação dos cursos da UEMA realizada pelo MEC fica aprisionada pela cúpula
da universidade, não chegando até aos colegiados de curso e departamentos.
Todos os segmentos da universidade (discente, docente e técnico-administrativo)
deveriam participar da análise dos resultados dessa avaliação e da formulação
de um plano de ação para o enfrentamento dos problemas e da implementação de
melhorias;
5) Falta de concurso público para
funcionário: pelo menos nos últimos 14 anos, não houve concurso para
funcionário. O quadro é dramático. A título de exemplo, a universidade possui
hoje cerca de trinta e cinco mil alunos e tem uma brutal carência de técnicos
de laboratório;
6) Burocracia massacrante em concurso para
professor: enorme dificuldade para abrir vaga. Superada esta etapa, o parto continua
difícil, até o professor ser empossado. Pelo menos, para algumas áreas do
conhecimento, dificultando, assim, a implantação de pós-graduação “strictu
sensu”, em áreas vitais para o desenvolvimento do Estado;
7) Baixa produção científica:
A publicação de artigos em periódicos internacionais e nacionais, embora tenha
melhorado graças ao empenho e à perseverança dos alunos e professores da UEMA
que fazem “das tripas, coração” e de abnegados funcionários, os indicadores de
pesquisa avaliados pela Folha: total de
publicações, total de citações, citações por artigo, publicações por docente,
publicações em revistas nacionais e captação de recursos, ainda são muito desfavoráveis para a
instituição. O número de: citações internacionais por docente, publicações em
coautoria internacional e docentes estrangeiros, “indicadores de
internacionalização avaliados pela Folha”, também é muito desfavorável para a
universidade. Mesmo assim, há resultados. Cresceram as bolsas de iniciação
científica concedidas pela FAPEMA, CNPq e pela própria UEMA. O número de
professores com Mestrado, Doutorado e Pós-Doutorado tem crescido, assim como o
de professores com dedicação exclusiva;
8) Inovação e Mercado: A
UEMA já possui alguns registros de depósitos de patente (inovação), embora os
números ainda sejam bastante modestos. Mas, a instituição ainda não possui uma
patente comercializada, questão essa ligada ao mercado;
9) O Programa Ciência sem
Fronteira já é uma realidade na universidade, principalmente pelo empenho dos
alunos e incentivo dos professores;
10) Captação de recursos:
Recursos têm sido captados pelos professores pesquisadores com projetos
aprovados em Editais de Agências de Apoio à Pesquisa como CNPq, FINEP, FAPEMA,
BNB e outros, mas esse fato ainda não é suficientemente valorizado nas
avaliações de mérito na instituição;
11) Extensão: O programa
de extensão também já existe na universidade, inclusive com edital para
publicação de livros, fato muito positivo na UEMA;
12) Congressos de âmbito internacional,
nacional e local: A universidade tem realizado ótimos eventos, a exemplo disso,
a Reunião Regional da SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência -
realizada no Maranhão, na UEMA, que contou com cerca de dez mil participantes e
com a presença de grandes conferencistas das universidades brasileiras e também
do Maranhão. Mas, por outro lado, alunos que têm trabalhos aprovados em
congressos fora do Estado nem sempre recebem apoio, pois também neste ponto, a
burocracia é infernal. Embora, em algumas áreas do conhecimento, haja menos
dificuldade.
Talvez todas, ou algumas dessas causas
acima mencionadas sejam responsáveis pelo baixo desempenho da instituição.
Assim, é responsabilidade de todos que
constituem a universidade transformar a avaliação da instituição, em um motor
de discussão e da busca de superação desse problema em todos os órgãos e colegiados
da UEMA. Entendo não ser esta tarefa exclusividade da universidade.
Preocupa-me, entretanto, o estágio de
letargia que acomete a nossa sociedade, que demonstra sintomas de falta de
indignação diante de situações, como essa, que humilham o nosso estado. Exemplo contundente disso: recentemente, o
município maranhense de Fernando Falcão foi classificado como um dos cinco
municípios mais pobres do país, apesar da sua fantástica biodiversidade, a qual
já permitiu inúmeros trabalhos científicos, como monografias de conclusão de
cursos, dissertações de mestrado, teses de doutorado, artigos nacionais e
internacionais, publicações em congressos locais, nacionais e internacionais,
bem como vários pedidos de patente de nossas universidades. Não é uma brutal
contradição?
Cabe, pois, ao poder público e à
sociedade civil, por meio de suas instituições, integrarem-se nesse debate e no desafio de
transformar a UEMA em uma grande Universidade, capaz de contribuir efetivamente
para tirar o Maranhão dos trilhos do atraso.
Já é passada a hora de se explicar
este enigma, que envergonha a todos nós: Estado do Maranhão: tão rico e tão pobre.
*Maria Célia Pires Costa
*Professora da UEMA com doutorado na
UNICAMP e Professora aposentada da UFMA. Foi secretária regional, conselheira e
diretora da SBPC; diretora científica da FAPEMA e secretária de educação de São
Luís em 1997/1998.